29 de maio de 2009

pensamento

E de repente ela se calou. Manoel de Barros diria que entrou em estado de árvore. Eu não entendo de árvores, mas compreendo os silêncios.

27 de maio de 2009

Pedaços de carnaval

Despediram-se. Era findo o carnaval. As fantasias continuavam pelo chão e os pedacinhos de confete se perdiam sobre a cama. Aquelas coisas todas prenunciavam o cheiro da quarta-feira de cinzas silenciosa. Não havia muito o quê dizer, eles sabiam que o amor iniciado na sexta-feira, acabaria, inevitavelmente, na noite da terça.

Naqueles dias, muita coisa foi dita, sem nenhuma delas ser previamente questionada. A certeza do anonimato e do fim anunciado permitiu-lhes trocar confidências. Trataram-se como se trata a própria consciência, aquela que tem a exclusividade dos pensamentos mais sombrios, dos medos enjaulados e das vontades impublicáveis.

Encontraram-se na rua, em meio aos blocos coloridos de pierrots e colombinas fantasiados. Ao se olharem de cara nua, meio deslocados na bagunça dos tambores e dos tamborins, se aproximaram encabulados. Sem dizer palavra alguma, rumaram para fora da folia e sentaram na sarjeta para fumar um cigarro.

- Eu tenho medo de deixar o gás ligado e um belo dia chegar em casa e não ter mais casa nenhuma. Eu às vezes penso em fugir de todas as pessoas que eu conheço, embora eu as ame sem medidas, só para ter de inventar uma vida nova e não me reconhecer mais na minha. Eu tenho vontade de fazer amor com um desconhecido numa noite de carnaval sem sequer saber seu nome.

- Eu tenho medo de encontrar uma desconhecida no carnaval e desejar fazer amor com ela, sem sequer saber seu nome. Eu tenho vontade de deixar o gás ligado em casa, só para um dia chegar lá e não ter mais casa nenhuma. Eu penso em conhecer e amar pessoas para abandoná-las depois.